Categoria: Música

LEILA PINHEIRO – “VERDE”

A cantora, compositora e pianista Leila Pinheiro surgiu para o grande público em 1985, no Festival dos Festivais, da Globo. Nascida em Belém do Pará, em 1960, ela abandonou o curso de Medicina no segundo ano, em 1980, quando decidiu seguir a carreira artística.

“Verde“, seu primeiro sucesso, é uma composição de Eduardo Gudin e João Carlos Costa Netto. Em 1985, depois de assistir a uma manifestação pelas “diretas já”, no Vale do Anhangabaú, os dois compositores resolveram registrar em música aquela sensação de retorno à democracia, vivenciada pelo povo brasileiro naquela ocasião.

Assim nasceu “Verde“, que foi inscrita no Festival dos Festivais, concorrendo com outras 10.314 músicas, das quais 48 seriam classificadas para as quatro eliminatórias. Em princípio, o intérprete de “Verde” – que ficou entre as 48 escolhidas – seria o cantor Lula Barbosa, mas ele já tinha sido escolhido para cantar “Mira Ira”, outra classificada.

Por isso, por sugestão de César Camargo Mariano, que gostou da interpretação de Leila em outra música, não classificada, Gudin e Costa Netto convidaram a cantora paraense para interpretar “Verde” no Festival.

Leila levou “Verde” à terceira colocação, ficando atrás apenas de “Escrito nas Estrelas” e “Mira Ira”, e, de quebra, faturou o prêmio de revelação do festival. No vídeo abaixo, ela canta “Verde”, em show de 2015:

“CIRANDA DA BAILARINA” – ADRIANA CALCANHOTO

Em 2004, a Adriana Calcanhoto – usando o pseudônimo de Adriana Partimpim – gravou um disco infantil e, entre as músicas escolhidas, incluiu a “Ciranda da Bailarina”, o que fez muita gente pensar que a canção seria dela.

Não é! “Ciranda da Bailarina” foi composta pela dupla Chico Buarque/Edu Lobo para a trilha sonora do balé “O Grande Circo Místico”, espetáculo inspirado no poema homônimo de Jorge de Lima, publicado no livro “A Túnica Inconsútil”.

O sucesso do espetáculo levou Chico e Edu a gravarem um disco, lançado em 1983, com a trilha sonora de “O Grande Circo Místico”, interpretada por artistas como Milton Nascimento, Gilberto Gil, Gal Costa, Simone, Tim Maia, Jane Duboc, Zizi Possi e, é claro, Chico e Edu.

O disco traz pérolas como “Beatriz”, uma homenagem de Chico a Beatrice, paixão de Dante de Alighieri. Como contraponto aos sete infernos de Dante, a Beatriz de Chico dança no “sétimo céu”. Traz, também, “Sobre Todas as Coisas”, onde Chico aborda a questão metafísica, questionando se o Criador nos criou para adorarmos a Ele.

“Ciranda da Bailarina” é a oitava faixa do disco, interpretada por um coral infantil formado por filhos e sobrinhos do Chico e do Edu. A música fala sobre a bailarina porque essa figura costuma ser associada à ideia de perfeição. Ou seja, fora ela, todo mundo tem algum problema.

O detalhe curioso é que, na versão gravada em 1983, foi suprimida uma palavra por imposição da censura da ditadura militar. “Pentelho”, que o Chico rimou com vermelho e o Faustão rima com qualquer coisa, era – pasmem! – um palavrão, segundo os estranhos critérios da ditadura militar, que, em “Fado Tropical”, proibiu a palavra “sífilis”.

Outro detalhe: “O Grande Circo Místico” virou filme em 2018 e está sendo indicado para disputar uma vaga no Oscar 2019, concorrendo na categoria “Melhor Filme de Língua Estrangeira”.

Vejamos, agora, o vídeo em que a Adriana Calcanhoto – ou Partimpim – interpreta a “Ciranda da Bailarina”:

LUCY ALVES – “SABIÁ”

Em 2012, antes mesmo de se tornar conhecida como cantora por sua participação no The Voice, em 2013, e como atriz, por sua performance na novela global Velho Chico (2016), Lucy Alves já tinha sido apresentada aos leitores deste modesto blog, cantando com Alceu Valença (aqui). 

Com a imagem associada ao acordeon, Lucy, na verdade, é uma multi-instrumentista que toca, com competência, violino, violão, guitarra, viola, bandolim, baixo, cavaquinho, rabeca, piano e, é claro, sanfona. 

Tamanha versatilidade não acontece por acaso. De família musical, a paraibana Lucyane Pereira Alves começou a tocar violino aos quatro anos de idade. Aos 16, ela integrava o grupo Clã Brasil, ao lado de duas irmãs – Larissa e Lyzete – da mãe Maria José e do pai José Hilton. 

No vídeo abaixo, Lucy Alves interpreta “Sabiá”, um dos clássicos da dupla Luiz Gonzaga e Zé Dantas. Gravada pela primeira vez em 1951, pelo Rei do Baião, o compositor faz um apelo ao sabiá pedindo que o pássaro símbolo do Brasil, que tanto já voou, alivie a sua dor e lhe diga por onde anda o seu amor. 

Os pássaros, por sinal, estão muito presentes na obra de Gonzagão e seus parceiros. A asa branca e o assum preto são dois exemplos. Até o sinistro acauã e mítica carimbamba – aquele pássaro que encantava donzelas e desaparecia com elas em uma lagoa – serviram inspiração para Gonzagão. 

As aves pareciam ser mesmo importantes para Gonzagão. Seus biógrafos contam que, em certa ocasião, consciente de que a asa branca estava sumindo do Nordeste, ele resolveu fazer uma visita ao general João Figueiredo – último presidente da ditadura militar – para falar sobre o assunto.  

Gonzagão teria comparecido ao encontro vestido todo a caráter e com duas aves nos ombros, mas não conseguiu falar com Figueiredo. Segundo os biógrafos, a assessoria do presidente não aprovou a indumentária do Velho Lua e tratou de expulsá-lo do Palácio do Planalto. 

No vídeo abaixo, Lucy Alves canta “Sabiá”:

JOÃO BOSCO E DJAVAN – “CORSÁRIO”

Um dos letristas mais engenhosos da música popular brasileira, o compositor e escritor Aldir Blanc Mendes está completando 72 anos neste domingo, 02. Nascido em setembro de 1946, ele estudou Medicina, especializando-se em Psiquiatria. Em 1973, no entanto, ele abandonou a medicina para dedicar-se exclusivamente à música. 

Notabilizou-se por sua parceria com João Bosco, mas suas primeiras músicas foram compostas com Sílvio da Silva Júnior, incluindo seu primeiro sucesso, “Amigo é Prá Essas Coisas”, vice-campeã no Festival de Música da TV Tupi, em 1970. 

Conheceu João Bosco em 1971 e inauguraram a parceria com “Agnus Sei”. O dado curioso é que, durante algum tempo, a parceria deles foi à distância. Aldir escrevia os versos e os enviava a João Bosco, que se incumbia de musicá-los. 

Uma das músicas mais conhecidas da parceria Aldir Blanc/João Bosco é “O Bêbado e a Equilibrista”, que, lançada em 1979, se tornou um hino contra a ditadura militar. Nela, Aldir pedia “a volta do irmão do Henfil”, o sociólogo Betinho, àquela altura exilado no exterior. 

Outra das canções mais conhecidas da dupla, “Corsário”, foi gravada originalmente por Elis Regina e, no vídeo abaixo, é interpretada por João Bosco e Djavan. Nessa música, Aldir se utiliza de muitas figuras – o coração, por exemplo, foi comparado a um cofre gelado – para explicar o drama provocado pelo afastamento que se dá entre o poeta e a mulher amada.

 

PAULINHO MOSKA – “EU SEI QUE VOU TE AMAR”

Eu Sei Que Vou Te Amar”, da dupla Tom Jobim e Vinícius de Moraes, é uma das minhas músicas preferidas. Tanto que, em certa ocasião, juntei em um CD regravável – que eu ouvia repetidamente – nada menos que 20 versões dessa canção. A de Milton Nascimento era, talvez, a que eu mais gostava.

De lá para cá, novas e belas versões  surgiram, como as de Ana Carolina, Vanessa da Mata e Roberto Carlos. “Eu Sei Que Vou Te Amar” é, sem dúvida, uma das músicas  brasileiras mais regravadas, inclusive em outras línguas, como a francesa “Tu Sais Je Vais T’aimer”, de Diana Panton.

Gravada pela primeira vez no início de 1959, pela cantora Lenita Bruno, “Eu Sei Que Vou Te Amar” chegou ao final daquele ano com a espantosa quantidade de 24 versões diferentes. A de maior sucesso foi a da cantora paulista Elza Laranjeira, companheira de Agostinho dos Santos.  

Mas a versão que marcou minha geração foi, certamente, a de Toquinho, Vinícius e Maria Creuza(foto acima). Gravada em 1972 – mesmo ano em que Toquinho e Vinícius estiveram em Jales (veja aqui), sem a Maria Creuza, mas acompanhados pela cantora Marília Medaglia – essa versão incluiu o “Soneto da Fidelidade”, declamado pelo poetinha.

No vídeo abaixo, temos o ex-Inimigos do Rei, Paulinho Moska, que começa sua interpretação declamando o “Soneto da Fidelidade”. O vídeo foi gravado durante espetáculo em homenagem a Tom Jobim, o autor da melodia.

ELIS REGINA – “ROMARIA”

Hoje não tem Brasil & Cia na Regional FM. É a minha folga anual. A rádio transmitirá uma programação especial por conta da Romaria Diocesana que acontece neste domingo, em homenagem à padroeira da Diocese de Jales, Nossa Senhora da Assunção.

A 34ª Romaria Diocesana deverá sair das proximidades da Igreja Santo Expedito – bem pertinho da casa que habito – por volta das 14 horas, com chegada prevista para as 15h30 na Catedral de Jales, onde será realizada uma celebração especial.

E se a nossa Romaria tem 34 anos, a música “Romaria”, do Renato Teixeira, é um pouco mais velha. Composta em 1977, ela está completando 41 anos, mas continua atual. Antes de ser gravada em disco, “Romaria” foi lançada por Elis Regina – grávida de sete meses – em um espetáculo chamado “O Fino da Música“.

Conta a lenda, que “Romaria” foi composta em apenas meia hora e entregue a Elis – que Renato conhecera num estúdio de gravação de jingles – em uma fita. A música fala de um caipira herege arrependido, que busca a paz na igreja. Ela nasceu das lembranças de episódios de fé religiosa presenciados por Renato em Aparecida do Norte.

O vídeo abaixo é de abril de 1978, gravado durante o show “Transversal do Tempo“, que percorreu várias cidades do país e do exterior. O show acabou gerando alguma polêmica, pois, enquanto Elis cantava “Gente“, do Caetano Veloso, o cenário mostrava algumas placas de trânsito onde estava escrito “Beba Gente“. Caetano não gostou da brincadeira e reagiu indignado, declarando à imprensa que sua música estava sendo alvo de deboche.

MORRE ARETHA FRANKLIN, LENDA DA SOUL MUSIC, AOS 76 ANOS

A notícia é do portal MSN:

Aretha Franklin morreu nesta quinta-feira aos 76 anos. A assessora da cantora, Gwendolyn Quinn, confirmou a informação à agência Associated Press, juntamente com um comunicado da família. Aretha morreu em sua casa, em Detroit, às 9h50 (8h50 no horário de Brasília). O motivo da morte foi câncer de pâncreas do tipo neuroendócrino. 

“Em um dos momentos mais tristes de nossas vidas, não temos palavras apropriadas para expressar a dor em nossos corações. Perdemos nossa matriarca, a rocha da nossa família. O amor que ela tinha por seus filhos, netos, sobrinhos, sobrinhas e primos não tinha limite”, diz o comunicado da família. 

A cantora foi diagnosticada com a doença em 2010, o que a levou a se afastar dos palcos por um período. Sua última performance pública aconteceu na Filadélfia, em agosto de 2017. 

Apelidada de rainha da soul music, Aretha Franklin é considerada uma das melhores vozes da história da música, referência para outros nomes que surgiriam na indústria, como Whitney Houston, Beyoncé e Adele. Ao longo de sua trajetória, ela soma 18 estatuetas no Grammy, torna-se a primeira mulher a entrar para o cobiçado Rock & Roll Hall of Fame, em 1987, e recebe a Medalha Presidencial da Liberdade – a maior condecoração para um civil americano – das mãos do então presidente George W. Bush, em 2005.

No vídeo abaixo, o estimado leitor poderá ouvir Aretha Franklin cantando “What I Did For Love”, enquanto aprecia cenas do filme “Doce Novembro”, com o Keanu Reeves e a linda e oscarizada Charlize Theron. Detalhe: a música da Aretha não está na impecável trilha sonora do filme, mas poderia (ou deveria) estar.

 

ZÉLIA DUNCAN – “NAQUELA MESA”

Daqui a pouco, às 10:00 horas, estarei lá na Regional FM, onde apresento, aos domingos, o Brasil & Cia. E hoje, Dia dos Pais, é dia de alguns ouvintes pedirem aquela música piegas do Fábio Júnior, “Pai Herói”. E, como faço há 24 anos, inventarei um desculpa qualquer para não tocá-la.

Até alguns anos atrás, eu dizia que “o CD do Fábio Júnior sumiu“. Atualmente, com todas as músicas no computador, essa desculpa não cola. Terei que ser mais criativo.

Haverá, também, aqueles que, com gosto mais apurado, pedirão “Naquela Mesa” para homenagear os pais que já se foram para o outro lado do mistério. Segundo consta, a letra dessa música teria sido escrita por Sérgio Bittencourt em um guardanapo,  durante o velório de seu pai, Jacob Pick Bittencourt, o Jacob do Bandolim.

Sérgio Bittencourt, que além de compositor era jornalista, não escondia a admiração pelo pai, apesar de manter com ele uma relação meio que conturbada. Certa vez, em um texto para o jornal “Última Hora”, ele disse que Jacob do Bandolim “foi mais do que um pai. Do que um amigo. Do que um ídolo. Foi um homem. Com todas as virtudes, fraquezas e defeitos de um homem com H maiúsculo”.

Se “Naquela Mesa” foi mesmo escrita no dia da morte de Jacob, não se pode ter certeza. O fato é que Jacob morreu em 1969, num 13 de agosto, aos 60 anos, e a música do filho só foi lançada em 1972, em um disco da divina Elizeth Cardoso.

Grande compositor (“Modinha” é sua obra prima) e jornalista polêmico, Sérgio Bittencourt ficou mais conhecido como jurado do programa Flávio Cavalcanti. Em 1970 sua música “Acorda, Alice” foi proibida pela censura da ditadura militar devido ao ingênuo verso “Acorda, Alice / Que o país das maravilhas acabou”.

Hemofílico, Bittencourt morreu em julho de 1979, com apenas 38 anos. No vídeo, Zélia Duncan canta “Naquela Mesa”, acompanhada por Hamilton de Hollanda, nosso melhor bandolinista, e Nilze Carvalho, nossa mais talentosa caviquinista.

Veja AQUI.

ELZA SOARES E BABY DO BRASIL – “MALANDRO”

Eu já postei aqui neste modesto blog um vídeo com a Baby do Brasil cantando “Malandro“, mas acho que vale pena o repeteco. Neste novo vídeo, gravado em 2018, o samba de Jorge Aragão é lindamente interpretado pela Elza Soares e a Baby do Brasil, acompanhadas pela Orquestra Jazz Sinfônica.

“Malandro” foi o samba que, gravado originalmente pela Elza Soares em 1976, impulsionou a carreira de Jorge Aragão como compositor. Aos 88 anos de idade, Elza enfrenta problemas de saúde, mas não abandona os palcos.

Menina pobre, ela foi obrigada pelo pai a se casar com apenas 11 anos. Aos 12 anos, teve o primeiro filho, que faleceu ainda bebê. O segundo também faleceu, mas, mesmo assim, quando ficou viúva, aos 21 anos, ela tinha cinco filhos vivos e, para cria-los, trabalhou como faxineira e empregada doméstica.

Elza iniciou sua carreira como cantora no Show de Calouros, do Ary Barroso. Aos 27 anos, já atuando como cantora, conheceu Mané Garrincha, com quem se casou em 1968. No ano seguinte, a casa de Elza e Garrincha foi metralhada pela ditadura militar e os dois resolveram se mudar para a Itália, onde ficaram seis anos.

Já a Baby do Brasil nasceu Bernardete Dinorá de Carvalho, em 1952. No final dos anos 60, ela fugiu de casa, em Niterói, e se mandou para Salvador, onde conheceu Moraes Moreira, Paulinho Boca de Cantor, Galvão e Pepeu Gomes, que seria seu primeiro marido, e formou com eles o grupo Novos Baianos.

O vídeo tem sete minutos, mas vale a pena ser visto.

POR LULA, GILBERTO GIL E CHICO BUARQUE VOLTAM A CANTAR ‘CÁLICE’ 45 ANOS DEPOIS

Em 1973, Chico e Gil tentaram cantar “Cálice” durante um festival, mas a música – que muita gente pensa ter sido composta por Chico e Milton Nascimento – tinha sido censurada e os microfones foram desligados. A matéria está pendurada no portal da Carta Capital

Em uma entrevista ao documentário “Canções do Exílio”, Gilberto Gil admite até hoje ter dificuldade de cantar a canção “Cálice”, escrita em parceria com Chico Buarque. O motivo? “Porque ela é sobre a dor, o tormento, a repressão, a censura. E tem essa história do ‘pai’. Eu tenho impressão que é mais por aí, essa imagem da primeira pessoa, da santíssima trindade, com sua sombra permanente sobre nós, essa ideia da paternidade como assalto à autonomia de uma individualidade.”

A rejeição não é apenas à letra, mas também à melodia “tristonha”. Como bem lembrou Breno Goés, autor de um texto que circulou após Gil e Chico cantarem “Cálice” no festival Lula Livre, realizado neste sábado 28, o compositor jamais gravou a canção para um álbum de estúdio. Preferia, lembra Goés, temperar a tristeza de felicidade e vice-versa, como fez em “Aquele Abraço”, ao se despedir do Brasil rumo ao exílio em tom carnavalesco.

Nem sempre Gil consegue, porém, deixar “Cálice” de lado. Há momentos em que a canção se impõe. Na apresentação no festival Lula Livre, havia um motivo óbvio para cantá-la: o homenageado do evento, preso há mais de três meses em Curitiba, escreveu um artigo intitulado “Afasta de mim esse cale-se”, sobre o veto da Justiça para que o petista conceda entrevistas e grave vídeos de dentro da cadeia.

O incômodo de Gil com a canção não é de hoje: já se fazia presente no ano em foi composta. Durante a Semana Santa de 1973, o compositor baiano e Chico passaram a se reunir para escrever uma música para um show marcado para maio daquele ano no Anhembi, em São Paulo.

Na Sexta-Feira da Paixão, Gil lembrou-se da oração de Jesus na hora da agonia. “Pai, afasta de mim esse cálice, mas seja feita a Vossa vontade”. Associou-a à narrativa bíblica sobre a comunhão, em que o vinho simboliza o sangue de Cristo. O refrão  “Pai, afasta de mim esse cálice/ De vinho tinto de sangue”, escrito por Gil, foi o ponto de partido da canção.

A relação entre “cálice” e “cale-se” foi imeadiatamente apontada por Chico, que a associou ao silêncio imposto pela ditadura. Cada um compôs uma parte da música: além da primeira estrofe, o baiano escreveria a terceira. A Chico, caberia a segunda e a quarta.

Após o veto tardio a “Apesar de Você”, canção de Chico que vendeu 100 mil exemplares em uma semana antes de a ditadura mandar recolher as cópias, a censura estava mais atenta e proibiu “Cálice'”. No dia do show no Anhembi, Chico e Gil insistiram em apresentar a composição, mas a gravadora de ambos, a Polygram, mandou os técnicos de som cortar os microfones. Irritado com a censura, Chico disse: “Vamos para o que pode!”. E cantaram em seguida Baioque.

A faixa só foi formalmente gravada em 1978, quando Milton Nascimento e Chico registraram a faixa no elepê Chico Buarque. Gil nunca a incluiu em um disco de estúdio.

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