CRÔNICA: “É AINDA POSSÍVEL SONHAR?”

A crônica abaixo é de autoria do juiz da Vara Especial Cível e Criminal, Fernando Antônio de Lima. Vale a pena ler e refletir sobre a mensagem contida nela.

dr-fernando-img_1253É ainda possível sonhar?

A velocidade dos novos tempos, dos tempos que correm, não cessam, as imagens que vêm e vão, nós no centro de nós, sem eles, eles sem o nosso tempo, o nosso tempo que é nosso, tão e só nosso que não posso mais me encaminhar para você.

Ontem eu era nós, eles, você. O eu completo. Hoje eu sou eu apenas. Perco-me na instantaneidade do toque de um teclado. Entro num mundo cheio de imagens, de palavras, de rostos superficiais – imagens sem luz, palavras sem voz, rostos sem vida.

A superfície do rio parece linda. O sol realça o espelho do rio. Mas a vida do rio – os peixes – está dentro do rio. Nas redes sociais, tudo parece lindo, sorriso, alegria. É a superfície do rio. A vida lá não vive, porque a vida está dentro, mundo adentro da superfície fina da luz, da luz que brilha o sorriso falso das falsas promessas de amor.

Como viver neste mundo, que vende, troca, humilha, manda, ordena, na prepotência daqueles que, cegos, não veem a dor. Dos que viajam o mundo, mas não entendem o mundo dos humanos e dos animais. Dos que estudam anos a fio a doutrina, mas não sabem sentir o profundo do existir. Dos que perseguem para cumprir a sua verdade fechada, porque a porta de fora está fora do alcance dos seus olhos, a porta de fora está fora da vista do seu coração.

Eles olham nos limites de suas arrogâncias, neste mundo dos grandes que no mundo sublime serão os pequenos. Os anseios deles eles pregaram ser os anseios de todos, mas os anseios de todos não são os anseios deles. A fantasia desse mundo louco do eu é o delírio de um tempo do descarte, do são que faz o papel de louco, dos loucos que são os verdadeiros sãos.

Mas tem uma lei que eu queria buscar. “A arte de sorrir cada vez que o mundo diz não” (Maria Bethânia, Brincar de Viver). Sentar no barco da esperança e ver o olhar sorrindo para mim. Nas peles de uma ave que voa sem pensar. No tempo que para, para sem cessar.

É o meu sonho que eu quero realizar. Lá bem no fundo, onde há espaço para amar. Divisões provocarei com esse jeito estranho de estar. As estalagens da estrada fecharão suas hospedagens para mim.

Mas lá se vão os anos, e o amor de quem importa eu desfrutarei. Será que vale a pena mesmo o tapa nas costas? O sonho de verdade é a mulher dos meus sonhos, que está do meu lado me fazendo sonhar. Essa força me impulsiona para dentro, mas é um dentro que não fica só aqui dentro. É um dentro que irrompe para fora, um sopro de vento que quer abraçar a todos que querem ser abraçados sem querer abraçar.

É a posse da vida. Eu tomando posse da vida, e a vida tomando posse em mim. Não quero mais a vida tomando posse de mim. Quero sonhar a esperança de tudo mudar, ainda que a mudança seja molecular, atômica e pontiaguda. Pessoas? Muitas sairão, poucas chegarão e quase nenhuma delas ficará para oferecer a companhia do colo e do coração. Mas o que fica, o perene – poucas e reduzidas pedras – assenta-se firme nas águas do rio.

E, se agora estou em mim, agora estou no mundo. Como estar no mundo, sem estar no meu próprio mundo? Ocupar o meu local no mundo é apropriar do que é meu no mundo e, por isso, dentro daquelas cercanias, transformar o mundo. Transformar o mundo no meu local. Fora do meu local, o mundo me subtrai. Num dos desvãos da Terra, naquela casinha de sapê que me cabe, eu mudo a Terra.

E, nesse meu particular, eu sonho, eu grito, eu choro, eu falo, eu luto, e tenho esperança. Porque o sonho vai, o sonho se aquieta, mas o sonho volta e o sonho se inquieta. Nunca meu sonho fica parado. Quieto às vezes, parado jamais, porque é na quietude que a vida reflete o que a vida quer ser. Vamos comigo sonhar, meu amor. Na beleza do seu olhar eu sonho o meu amor pela vida. A locomotiva dos nossos sonhos não pode parar, a estrada da vida assim quer nos guiar.

Fernando Antônio de Lima – 9/9/2016

Inspiração: Adriana Monteiro Sanches de Lima, minha esposa amada.

5 comentários

  • Jales buraco-sp

    Parabéns pela pessoa e profissional continua assim sempre.. Deus continue abençoado sua vida

  • Jb

    Dr.fernando parabéns muito bom povo de Jales tem muito que agradecer desde da sua chegada em Jales como magistrado povo só tem agradece parabéns que Deus continue iluminando e abençoado

  • Simplesmente perfeita a crônica!
    Parabéns às poucas pessoas desse mundo que conseguem escrever: “daqueles que, cegos, não veem a dor”.
    Quando meu marido afastou-se do trabalho por problemas de saúde, descobrimos que tínhamos poucos amigos para nos ajudar. Mas disso tiramos uma lição: Se tivermos poucos amigos, mas verdadeiros, eles serão capazes de permitir que continuemos caminhando pela vida acreditando em nossos sonhos e esperanças, sendo nosso “ombro amigo”,algo tão raro hoje em dia.

  • claudemir

    Parabéns ao Exmo. Dr. Fernando pelas belas palavras. Me fez lembrar um texto Bíblico: O Senhor deu-me as suas palavras de sabedoria, a fim de que possa saber o que devo dizer aos que estão cansados. Em cada manhã ele me acorda e abre o meu entendimento à sua vontade. Isaias 50:4

  • Fiquei com inveja da musa inspiradora.Na minha condição,eu só posso inspirar uma bela surra.

Deixe um comentário para Jb Cancelar resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *