ARTIGO – “A MÃO PESADA DO ESTADO”

Alan de AbreuO jornalista Alan de Abreu – um dos profissionais mais corajosos e uma das mais brilhantes penas da imprensa interiorana – do Diário da Região, publicou nessa quinta-feira interessante artigo sobre o caso Reinaldo Azevedo, que reproduzo abaixo.

Antes, lembro que Reinaldo Azevedo – que agora está protestando, com razão, contra o vazamento de sua conversa com Andrea Neves – é o mesmo jornalista que achou tudo normal (ou mais que isso: quase teve orgasmos) quando o juiz imparcial de Curitiba, Sérgio Moro, vazou as conversas de Lula com Dilma e de dona Marisa Letícia com um filho.

Vamos ao artigo: 

Reinaldo Azevedo sempre privilegiou o tom panfletário em detrimento do bom jornalismo. Nos últimos 12 anos, vendeu-se no programa “Os pingos nos is” na rádio “Jovem Pan” e em seu blog na “Veja” como um liberal antipetista, mas nunca deixou de ser um ultraconservador, sempre simpático a Temer e seus acólitos e aos tucanos de alta plumagem.

Enquanto a Operação Lava Jato se ocupava com os desmandos petistas, Azevedo permanecia na confortável posição de áulico da ética e da moralidade. Mas, quando os ventos da megainvestigação passaram a mirar também tucanos e peemedebistas com passado mais do que suspeito, o jornalista, com seu característico tom incendiário e picaresco, sobretudo na Jovem Pan, começou uma campanha com fortes críticas aos procuradores que conduzem a Lava Jato, sobretudo o procurador-geral Rodrigo Janot.

Na última semana, quando a delação de Joesley Batista, da JBS, veio à tona, Azevedo acentuou suas críticas à operação. Passou a argumentar que a Procuradoria Geral da República arquitetava um golpe para tirar Temer do poder.

A resposta da Lava Jato a Azevedo viria nesta terça-feira, dia 24, da pior maneira possível. O site Buzzfeed “encontrou”, entre as centenas de áudios do inquérito que investiga Temer e o tucano Aécio Neves, conversas entre o jornalista e Andrea Neves, irmã do senador Aécio. O sigilo fora levantado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin.

São diálogos fortuitos entre jornalista e fonte, sem o mínimo indício de crimes. Mas profundamente constrangedores para Azevedo, que qualifica a revista “Veja”, uma de suas empregadoras, de “nojenta”, por ter produzido, naqueles dias de abril, uma reportagem sobre as suspeitas contra o senador mineiro.

Azevedo pediu demissão da “Veja” e divulgou uma nota em que protesta contra a divulgação da conversa pelo STF e a consequente quebra do sigilo de fonte.

Pessoalmente, não gosto do trabalho do jornalista: incendiário, arrogante, que não raro beira o pedantismo. Mas não posso deixar de protestar contra a divulgação desses diálogos, que não prestam a nenhuma investigação e por isso nem deveriam estar no inquérito.

Sei bem como agem certos agentes públicos quando se veem contrariados por um jornalista. Em 2011, o então procurador do MPF em Rio Preto, Álvaro Stipp, ordenou o meu indiciamento na Polícia Federal pela divulgação de escutas em um esquema de corrupção na delegacia do Ministério do Trabalho em Rio Preto. Tudo porque me neguei a revelar a ele a fonte daquelas informações. Posteriormente, nesse mesmo caso, o juiz federal Dasser Letière Jr determinou a quebra do sigilo telefônico de toda a redação do Diário na tentativa de se chegar à fonte da minha reportagem. Hoje o caso está no STF, à espera de julgamento.

Nesse meio tempo, em 2015, fui indiciado novamente pelo mesmo crime, desta vez pelo delegado Airton Douglas Honório, por divulgar escutas telefônicas referentes à investigação de um sequestro em Rio Preto. Após forte reação de entidades, o caso foi arquivado e o indiciamento, anulado.

Nem Stipp nem Honório receberam qualquer reprimenda formal pelos seus atos claramente atentatórios à liberdade de imprensa. Pelo contrário: Stipp foi promovido a procurador do Tribunal Regional Federal, em São Paulo, e Honório teve arquivado um inquérito contra si na Corregedoria da corporação.

De minha parte, não me arrependo de nenhuma linha que escrevi nos dois casos. Faria tudo de novo. Nós, jornalistas, precisamos estar vigilantes e combativos diante da mão pesada do Estado, que nem sempre está a serviço do bem comum.

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