Categoria: Música

MÚSICA LANÇADA POR CANTORA DE PARANAPUÃ É REGRAVADA POR MAIARA & MARAÍSA PARA NOVA NOVELA DA GLOBO

A música “Você Vai Ver”, dos compositores Elias Muniz e Carlos Colla, lançada pela cantora Jayne  em seu terceiro álbum (capa ao lado), gravado em 1993, foi regravada pela dupla Maiara & Maraísa para a trilha sonora da nova novela da Globo“Além da Ilusão” – que estreia na segunda-feira, 07, no horário das 18 horas.

Jayne Molina, como era conhecida aqui em Jales nos tempos de estudante, ficou conhecida como a “rainha dos rodeios” nos anos 90, quando adentrava as arenas montada em um cavalo branco. Em pouco mais de 30 anos de carreira, ela já conta com 21 álbuns. Jayne nasceu em Paranapuã e, segundo a Wikipedia, tem 52 anos de idade. Deixemos, porém, esse detalhe da idade de lado.

A música “Você Vai Ver”, que fez sucesso com a Jayne, conseguiu sucesso ainda maior com a dupla de pintassilgos Zezé di Camargo & Luciano, que a regravou em 1994, no quarto álbum de estúdio da dupla, que vendeu mais de 1 milhão de cópias. 

Um detalhe curioso sobre essa música é que o letrista Carlos Colla, um dos seus autores, não gostou da letra que escreveu e, segundo o co-autor Elias Muniz, amassou o papel onde rascunhara a música e jogou no lixo. Depois que Colla foi embora, Muniz recuperou o papel no cesto de lixo e o guardou.

Segundo Muniz, eles estavam cansados pois naquele dia já tinham feito outras três ou quatro músicas para um grupo de pagode (Os Travessos) e talvez por isso Colla, esgotado, não tivesse gostado da letra de “Você Vai Ver”.

Algum tempo depois, a música foi parar nas mãos de Jayne, que gostou da letra. “Você Vai Ver” tinha sido, no entanto, composta em ritmo de samba para os pagodeiros, de modo que a cantora, ciente de que o samba não era sua praia, pediu ao maestro Eduardo Lages – o mesmo do Roberto Carlos – para fazer um arranjo mais abolerado.

Um ano depois, quando os dois filhos do seo Francisco decidiram regravar a música, eles pediram ao maestro Eduardo Lages um arranjo parecido com o que ele tinha feito para a Jayne.

Agora, só nos resta esperar para ver como será o arranjo feito para a releitura de Maiara & Maraísa. A versão delas deverá estar disponível nas plataformas digitais nessa sexta-feira, 04.

Fiquemos, por enquanto, com a versão da Jayne, que pode ser ouvida no vídeo abaixo:

CHICO BUARQUE E NARA LEÃO – “COM AÇÚCAR, COM AFETO”

Chico Buarque – o compositor brasileiro que mais entende a alma feminina – causou certa polêmica com a declaração dada a um programa veiculado pela Globoplay, onde ele diz que não mais cantará a música “Com Açucar, Com Afeto”, por conta de críticas de movimentos feministas à letra da canção.

Não é a primeira vez que as feministas se insurgem contra uma música do Chico. “Mulheres de Atenas”, lançada em 1976, no disco Meus Caros Amigos, também causou desassossego entre elas, que só se acalmaram depois que Chico explicou que a música foi feita para uma personagem feminista de uma peça teatral igualmente feminista.

Chico explicou, também, que, ao dizer “mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas”, ele quis ressaltar exatamente o contrário, ou seja, que as mulheres de hoje não sigam os mesmos destinos daquelas mulheres, que se esqueciam de si próprias para viver tão-somente para seus esposos.

Um ano antes de “Mulheres de Atenas”, em 1975, Chico já tinha composto outra música – “Sem Açúcar” – que dava voz a uma mulher submissa e oprimida pelo machismo do marido. A música foi cantada por Maria Bethânia no show Chico & Bethânia, transformado em disco naquele mesmo ano. Eis um trecho de “Sem Açúcar”:

Dia ímpar tem chocolate, dia par eu vivo de brisa
Dia útil ele me bate, dia santo ele me alisa
Longe dele eu tremo de amor, na presença dele me calo
Eu de dia sou sua flor, eu de noite sou seu cavalo

E ontem, sexta-feira, a cantora e compositora Fernanda Takai – que gravou “Com Açúcar, Com Afeto” no CD “Luz Negra”, de 2009 – entrou na polêmica através de uma publicação no twitter, onde declara que continuará cantando a música do Chico em seus shows.

Maria Bethânia, Fafá de Belém, Zizi Possi e Rosa Passos, que também gravaram “Com Açúcar, Com Afeto”, não se manifestaram. Vejam agora a notícia do portal da Fórum:

O cantor e compositor Chico Buarque afirmou durante o programa “O canto livre de Nara Leão”, dirigido por Renato Terra para a Globoplay, que não cantará mais a canção “Com açúcar, com afeto”, composta por ele originalmente para a voz de Nara Leão.

A razão para tal são as críticas dos movimentos feministas ao machismo da letra, que discorre sobre uma mulher que é deixada diariamente em casa enquanto o marido sai para beber todos os dias.

De acordo com Chico, a canção, de 1967, foi feita por encomenda para Nara Leão, que pediu a ele uma letra que falasse de uma mulher sofrida, já naquela época nem tão comuns na música brasileira, como haviam sido anos antes.

“Ela me encomendou essa música, ela falou ‘eu quero agora uma música de mulher sofredora’. E deu exemplos de canções do Assis Valente, Ary Barroso, aqueles sambas da antiga, onde os maridos saíam para a gandaia e as mulheres ficavam em casa sofrendo, tipo ‘Amélia’, aquela coisa. Ela encomendou e eu fiz”, explicou Chico, na série.

Chico não comentou quando tomou a decisão ou se haveria outras de seu repertório que também não serão mais executadas devido a essas críticas. No filme, Chico lembra que ele não tinha na época a consciência que tem hoje sobre o machismo da letra.

“Eu gostei de fazer (a canção). A gente não tinha esse problema (a crítica das feministas). É justo que haja, as feministas têm razão, vou sempre dar razão às feministas, mas elas precisam compreender que naquela época não existia, não passava pela cabeça da gente que isso era uma opressão, que a mulher não precisa ser tratada assim. Elas têm razão. Eu não vou cantar ‘Com açúcar e com afeto’ mais e, se a Nara estivesse aqui, ela não cantaria, certamente”.

Acabei escolhendo “Com Açuçar, Com Afeto”, a primeira composição de Chico com o “eu lírico” feminino.

“Com Açucar, Com Afeto” foi composta em 1967, para atender a uma encomenda de Nara Leão. Chico contou, em uma entrevista, que Nara pediu a música e lhe deu o tema com detalhes. “Eu quero uma canção que fala de uma mulher que sofre, resignada, à espera do marido, etc e tal…”., sugeriu a dona dos joelhos mais bonitos da Bossa Nova.

 

OITO ANOS DA MORTE DE CONSTANTINO MENDES, O COMPOSITOR JALESENSE QUE COLOCOU APARECIDA DO TABOADO NO MAPA MUNDIAL

A música não é feita só de Elis Regina e Elza Soares, as artistas mais comentadas durante esta semana, infelizmente por motivos tristes. E por motivos igualmente tristes, hoje é dia de lembrar o compositor jalesense Constantino Mendes.

Afinal, nesta data, está completando oito anos que Constantino morreu, aos 57 anos, em consequência de problemas cardíacos. Moço simples, que eu encontrava de vez em quando pelas ruas de Jales, Constantino talvez seja o único jalesense citado no dicionário Cravo Albin, a enciclopédia da música brasileira.

O violonista Glauber Seixas, filho do jalesense Luiz Carlos Seixas, é outro que, apesar de ainda jovem, já está entre os verbetes do dicionário Cravo Albin. Glauber, porém, nasceu em Ourinhos, de onde partiu para o Rio de Janeiro, com o violão e a coragem, para mostrar seu talento. Ele já tocou inclusive com Elza Soares.

Voltando ao Constantino, ele foi o responsável por tornar o nome de Aparecida do Taboado(MS) conhecido no Brasil e na América Latina, através de uma composição sua – “60 Dias Apaixonado” – em parceria com o mineiro Darcy Rossi, lançada em 1979 pela dupla Chitãozinho e Xororó.

A amigos, Constantino dizia que a musica estava praticamente pronta quando, por exigência da gravadora, foi repassada a Darcy Rossi (o autor de “Fio de Cabelo”), que acabou sendo incluído como parceiro. No documentário “Nesses Versos”, Chitãozinho conta que a música foi encomendada a Constantino, numa época em que a dupla fazia muitos shows aqui na nossa região.

Chitãozinho, por sinal, foi parceiro de Constantino em outra música – “Amor Proibido” – gravada pelos irmãos paranaenses no LP “Amante”, de 1984. Constantino compôs mais de 300 músicas, algumas delas gravadas por diversas duplas. 

Regravada por artistas como Milionário e José Rico, Irmãs Castro e Michel Teló, o chamamé – um ritmo que muita gente supõe ser originário do pantanal mato-grossense, mas, cuja origem é a Argentina – “60 Dias Apaixonado” é considerado um segundo hino de Aparecida do Taboado.

No vídeo abaixo, “60 Dias Apaixonado”, a música escrita por um jalesense que colocou Aparecida do Taboado no mapa mundial, é interpretada por Chitãozinho e Xororó, com participação de Maiara e Maraísa:

REPÓRTER DA GLOBO SE EMOCIONA AO FALAR DO VELÓRIO DE ELZA SOARES

O repórter da Globo, Alexandre Henderson, se emocionou ao falar hoje cedo direto do Theatro Municipal do Rio, onde está sendo velado o corpo da cantora Elza Soares.

“É uma referência, Elza. Quando olhamos essa cena, pensamos na referência como mulher preta, artista. A Elza que cantou muito que ‘a carne mais barata do mercado é a carne negra’. Foi uma mulher atuante: denunciou e falou sobre o racismo, sobre a opressão da população negra, foi uma mulher que se posicionou muito em relação às questões da mulher, da comunidade LGBTQIA+, uma mulher a frente do tempo. Elza foi uma artista muito, mas muito necessária e muito atual”, disse o repórter.

Ele disse, ainda, que Elza “deixa uma lacuna na música popular brasileira, mas também um legado. Aquele corpo que está ali é de uma mulher que marcou sim a história da música brasileira, a história do Brasil. Uma mulher com uma lucidez política estrondosa. Sou fã de Elza, estou muito tocado porque a Elza marcou diversas gerações, cantou com diversos cantores e gêneros. Estou com o coração na mão e nó na garganta que a gente se despede dessa cantora, uma das maiores do mundo”, concluiu o jornalista.

Penso que as palavras do repórter, em meio a tudo que se disse sobre Elza entre ontem e hoje, resume bem a importância dessa cantora brasileira, eleita pela BBC de Londres como “a voz do milênio”.

No vídeo abaixo, ela canta “Mas Que Nada”, do Jorge Ben Jor, acompanhada pela Orquestra Jazz Sinfônica Brasil e pelas cantoras Rosana ,Sandra de Sá ,Paula Lima ,Vânia Bastos, Baby do Brasil, Raquel Virgínia e Liniker.

ELIS REGINA, 4O ANOS SEM A PIMENTINHA

Me lembro bem do dia 19 de janeiro de 1982. Eu trabalhava no posto avançado do Banco do Brasil em Santa Albertina e quando cheguei, com outros três colegas de trabalho, ao hotel-restaurante em que almoçávamos, a TV estava ligada e só se falava da morte de Elis.

Eu ouvia muito Elis Regina, principalmente o LP “Falso Brilhante”, lançado em 1976 com músicas como “Fascinação”, “Velha Roupa Colorida”, “Gracias a La Vida”, “Tatuagem” e “Como Nossos Pais”, mas, confesso, ainda não tinha ideia da grandiosidade da cantora, que morreu com apenas 36 anos.

“Falso Brilhante” – que tinha três músicas da dupla João Bosco/Aldir Blanc – foi o disco em que Elis apresentou um novo e talentoso compositor: o cearense Belchior.

Ela já tinha gravado “Mucuripe”, de Fagner e Belchior, mas não conhecia Belchior pessoalmente. Um dia, Elis viu um rapaz no corredor de uma gravadora e perguntou se ele era o Belchior. Veio, então, o convite para que ele fosse até a casa dela mostrar suas músicas. Belchior alegou que não tinha dinheiro para o táxi e Elis prometeu mandar seu motorista buscá-lo.

E assim foi feito. Na casa de Elis, Belchior apresentou várias músicas que ela ouviu atentamente sem falar nada. O compositor achou que não estava agradando, mas, quando terminou, Elis falou: “vou gravar essas duas”. Ela falava de “Como Nossos Pais” e “Velha Roupa Colorida”.

Elis era assim. Tinha um faro para lançar novos compositores, ainda pouco conhecidos. Foi assim com Ivan Lins/Vítor Martins, Renato Teixeira, João Bosco/Aldir Blanc e o já citado Belchior. Foi assim também com Milton Nascimento, que é agradecido até hoje por Elis ter sido a primeira cantora a gravar uma música sua, no caso a “Canção do Sal”.

Em contrapartida, foi Milton quem apresentou Maria Rita, a filha de Elis, como cantora, ao convidá-la para gravar uma das músicas do disco “Pietá”, de 2002. Depois de gravar com Milton, Maria Rita construiu uma carreira de sucesso.

Curiosamente, Elis Regina morreu no mesmo dia em que Nara Leão estava completando 40 anos. Hoje, quando Nara Leão completaria 80 anos de idade (ela morreu com 47), estamos completando 40 anos sem a Elis. As duas não se davam muito bem e por razões do coração: Ronaldo Bôscoli, que namorou Nara acabou se casando com Elis.

Na música e na política, porém, elas estavam do mesmo lado. Ambas gostavam de gravar a nata da MPB. E ambas militavam na esquerda. Elis Regina tinha se filiado ao Partido dos Trabalhadores (PT) um ano antes de morrer. E Nara Leão, que tinha o apelido de “Nara Coração de Leão” por sua coragem no enfrentamento à ditadura, era do Partido Comunista.

Vários jornais estão rendendo homenagens a Elis Regina nesta quarta-feira. Neste post se pode ver as chamadas de capa da Folha de Pernambuco, do jornal mineiro O Tempo, e do paulista Metro. Já nos jornais gaúchos (Elis era gaúcha de Porto Alegre), não se vê nenhuma chamada de capa sobre a data.

No vídeo abaixo, podemos ver uma Elis emocionada cantando “Atrás da Porta”. Chico Buarque começou a escrever a letra dessa canção durante uma festa na casa de Francis Hime, o autor da melodia. Ele conta que à certa altura da festa acabou a bebida e também a inspiração, de modo que a música ficou pela metade.

Algum tempo depois, Francis ligou dos Estados Unidos para Chico, dizendo que ele precisava terminar a música pois a Elis já tinha gravado a parte que estava pronta e queria gravar o resto. E, para provar que não estava mentindo, o Francis mostrou, via telefone, a gravação de Elis. Chico, então, escreveu meio que às pressas a segunda parte, que começa com “dei pra maldizer o nosso lar…”.

Em tempo: o apelido de Elis – “Pimentinha” – lhe foi dado pelo poetinha Vinícius de Moraes, por conta de sua aparência miúda e personalidade explosiva. Elis tinha um gênio, digamos assim, “ardido”.

 

MARIA BETHÂNIA E OMARA PORTUONDO – “SÓ VENDO QUE BELEZA”

Eu me lembro de ter lido, na Folha de S.Paulo, provavelmente em 1984, uma crônica do Carlos Heitor Cony falando sobre o compositor Henricão, que morreu em junho daquele ano. Nascido em janeiro de 1908, em Itapira(SP), Henrique Felipe da Costa era um negro de quase dois metros de altura, daí o justificado apelido Henricão.

Ator e compositor, ele era um gigante também quando o assunto era compor músicas. Embora tenha ficado meio esquecido depois de sua morte, ele foi autor de diversas canções, algumas delas inesquecíveis, entre elas o clássico “Está Chegando a Hora”, um dos maiores sucessos da história do carnaval.

Por sinal, Henricão era um entusiasta do carnaval e, segundo os mais antigos, foi o primeiro Rei Momo negro. Ele desfilava na escola de samba Vai-Vai, uma das mais tradicionais do carnaval paulista.

A marchinha “Está Chegando a Hora” é, em verdade, uma adaptação de “Cielito Lindo”, uma canção rancheira mexicana composta há mais de 130 anos por Quirino Mendoza, provavelmente um antepassado da Tereza Mendoza, a “Rainha do Tráfico” que inspirou uma série da Netflix.

Eu já mostrei aqui no blog uma versão recente de “Cielito Lindo”, com a Luiza Possi. A versão original de “Está Chegando a Hora” foi gravada por volta de 1941, pela Carmem Costa, a cantora predileta do Henricão.

Mas a obra de Henricão não se limita à adaptação de “Cielito Lindo”, que o mal humorado Ary Barroso classificou de plágio. Ele é o autor, também, da deliciosa “Só Vendo Que Beleza”, em parceria com Rubens Campos, gravada em 1942, adivinhem por quem? Ela mesma: Carmem Costa.

Essa canção foi regravada por Elis Regina em 1980, quando recebeu o subtítulo de “Marambaia”, sugerido pela Pimentinha. A sambista Teresa Cristina foi outra que regravou “Só Vendo Que Beleza”, junto com o Grupo Semente.

No vídeo, duas deusas da música – a baiana Maria Bethânia e a cubana Omara Portuondo – interpretam, ao vivo, “Só Vendo Que Beleza”, gravada por elas em disco de estúdio de 2008. Confiram o vídeo aqui.

TOQUINHO EXPLICA COMO COMPÔS “AQUARELA”

Dia desses, vi um podcast em que duas meninas entrevistam o Toquinho que, apesar do sobrenome italiano (Antonio Pecci Filho é o nome dele) e das ligações com a Itália, é um grande corintiano. Achei bastante interessante a entrevista, mas sou meio suspeito porque quase tudo que diz respeito a música me atrai muito.

Separei um trecho onde o Toquinho conta como foi o processo de criação da música “Aquarela”, de 1983, gravada por diversos artistas em vários idiomas e eleita na Espanha como uma das 20 melhores canções do século passado.

Se você é como eu e gosta de saber como foram feitas as músicas que a gente gosta, vale a pena investir 10 minutos do seu tempo no vídeo abaixo:

IVAN LINS E SIMONE – “COMEÇAR DE NOVO”

Para muita gente, começo de ano é tempo de recomeçar e, por isso mesmo, uma das canções mais lembradas nessa época de cada ano é “Começar de Novo”, música do Ivan Lins (melodia) e do Vítor Martins (letra), cuja versão mais famosa é a da cantora Simone, ex-seleção brasileira de basquete.

Essa canção foi feita sob encomenda para a trilha sonora do seriado global “Malu Mulher”, estrelado pela Regina Duarte, ambos – a música e o seriado – lançados em 1979. O seriado abordava temas polêmicos da época, como o aborto, a pílula anticoncepcional, o divórcio, a violência doméstica, etc. Fosse hoje, certamente discutiria assuntos como as tatuagens da Anitta, a mudança de sexo e a vacinação de crianças.

Ivan Lins conta que a música foi encomendada pelo diretor de séries da Globo, Daniel Filho, para a abertura de “Malu Mulher”. De posse da sinopse do seriado, Vítor Martins escreveu a letra falando sobre recomeços de vida após o fim de uma relação, que era, afinal de contas, o assunto principal da série, cuja personagem central, a Malu, era uma mulher separada.

No entanto, nas entrelinhas, a letra de Vítor dizia também que nós brasileiros precisávamos recomeçar uma nova vida, sem as amarras e as esporas do regime militar. Na época, o Brasil era presidido pelo general João Figueiredo, que dizia gostar mais de cheiro de cavalo do que do cheiro do povo.

Segundo Ivan, assim que recebeu a letra de Vítor, ele começou a musicá-la e demorou quase um mês para deixar a música pronta. “Levei uma surra. Foi realmente difícil”, diz Ivan.

Em princípio, três cantoras estavam cotadas para gravar a canção: Elis Regina, Maria Bethânia e Simone. Por algum motivo ainda não explicado, Simone foi a escolhida. De qualquer forma, Elis e Bethânia também foram incluídas na trilha sonora da série. Elis, com o hino da anistia, “O Bêbado e a Equilibrista”, e Bethânia com “Álibi”, uma das primeiras músicas do Djavan interpretada por ela.

“Começar de Novo” é a música da dupla Ivan e Vítor mais gravada mundo afora, com versões em várias línguas. Em inglês, a música recebeu o nome de “The Island” (A Ilha) e foi gravada por ícones como Barbra Streisand (aqui) e Sarah Vaughan, além de outros menos votados.

Como o nome indica, a versão em inglês não tem nada a ver com a letra de Vítor Martins. Tampouco com a lindíssima “A Ilha”, que o Djavan compôs em 1980 para atender a um pedido do Roberto Carlos, gravada pelo rei em seu LP daquele ano.

No vídeo, o Ivan Lins e a Simone cantam “Começar de Novo”:

 

CAETANO VELOSO – “BOAS FESTAS”

A marchinha “Boas Festas” – que eu já postei aqui no blog em 2017, cantada pelo Zeca Baleiro – é considerada o hino do Natal brasileiro. E se o Natal é uma época de presentes, festas e alegria, “Boas Festas”, contraditoriamente, é uma música triste. 

Seu autor, o baiano José de Assis Valente, era um sujeito que vivia entre a alegria e a tristeza, mas há quem diga que “Boas Festas” foi sua única música triste. Ele a compôs na véspera do Natal de 1932, quando já morava no Rio de Janeiro. Assis estava sozinho e deprimido na noite de 24 de dezembro, no quarto de uma pensão, quando pegou lápis e papel e começou a escrever.

Naquela noite solitária estava nascendo uma das mais conhecidas canções de Natal, que Assis Valente escreveu pensando em entregar para Carmem Miranda, mas, para sua decepção, ela não gravou sua música. Quem a gravou primeiro foi o grupo Anjos do Inferno, mas foi com a gravação de Carlos Galhardo, no ano seguinte, que “Boas Festas” fez sucesso.

Assis começou a compor em 1930, dois anos antes de escrever “Boas Festas”, e uma de suas primeiras músicas recebeu o sugestivo nome de “A Infelicidade me Persegue”. Em 1940, com a infelicidade ainda no seu encalço, ele se casou com uma datilógrafa, mas foi, provavelmente, um casamento de aparências, já que era homossexual. 

Em conflito com sua sexualidade, o compositor tentou o suicídio pela primeira vez alguns meses depois do casamento, mas fracassou. Assis pulou em um precipício de 800 metros, mas foi salvo por um galho onde se enroscou e acabou resgatado pelos bombeiros. Alguns anos depois, ele tentou se matar novamente, dessa vez cortando os pulsos.

Em uma tarde chuvosa do dia 11 março de 1958, alguns meses antes de Pelé e Garrincha conquistarem o caneco pela primeira vez, Assis Valente, bastante endividado (ele ganhava a vida fazendo dentaduras), veio a terceira tentativa de deixar este mundo cruel, dessa vez exitosa. Depois de engolir uma dose de formicida com guaraná, ele finalmente conseguiu passar a outro plano.

Antes do ato tresloucado, Assis ainda se deu ao trabalho de avisar a várias pessoas que aquele era o seu último dia. Em seu bolso, encontraram um bilhete endereçado a Ary Barroso, onde Assis pedia que o amigo fizesse o favor de pagar os dois meses de aluguel que devia ao dono da pensão.

Uma das versões mais famosas de “Boas Festas” é a dos Novos Baianos, gravada em disco de 1970. Além da já citada releitura de Zeca Baleiro, a música de Assis foi regravada também por Ivan Lins, Simone, João Gilberto, Maria Bethânia e Gaby Amarantos, entre outros.

Assis não deixou apenas “Boas Festas”. Bethânia, por exemplo, regravou “Camisa Listrada”, outro clássico do compositor. E quem não conhece “Brasil Pandeiro”, cuja versão mais famosa também é dos Novos Baianos? Deixou também “E o Mundo Não Se Acabou…”, uma sátira ao fim do mundo, regravada por artistas como Adriana Calcanhoto, Ney Matogrosso, Eliete Negreiros e Paula Toller.

No vídeo abaixo, quem canta “Boas Festas” é Caetano Veloso, em trecho de sua live de Natal do ano passado. Não foi a primeira vez que Caetano cantou a música do conterrâneo Assis Valente. Em 1996, ele gravou “Boas Festas”, em bonito dueto com Gilberto Gil (aqui), no disco “World Christmas”.

FRANK SINATRA – “MY WAY”

“My Way” é uma das músicas internacionais mais solicitadas no programa que apresento aos domingos na Rádio Regional, o Brasil & Cia. A versão mais solicitada, é claro, é a de Frank Sinatra, mas há quem goste de ouvir também com o Elvis Presley e o Paul Anka.

Ela é mais identificada, no entanto, com o velho Frank, que a gravou em dezembro de 1968 e, a partir de então, “My Way” era a música com que Sinatra encerrava seus shows. Isso só mudou quando surgiu “New York, New York”, que ele começou a cantar em 1968, mas só gravou em 1970.

Embora conhecida mundialmente com os já citados três cantores americanos, “My Way” é, originalmente, uma música francesa – “Comme D’Habitude”, ou, em português, “Como de Costume” – escrita pelos compositores Jacques Revaux e Gilles Thibaut. Em 1967, eles apresentaram a composição ao astro pop francês Claude Francois, que a gravou naquele mesmo ano, não sem antes modificar um pouco a música e, com isso, se tornar coautor.

Paul Anka, ao visitar a França, conheceu a música e, ao voltar aos Estados Unidos, tratou de escrever uma versão em inglês para ela. Na versão francesa, a música conta a história do fim de um casamento, sob a ótica do homem. Já na versão de Paul Anka, a música conta a história de um sujeito que, pressentindo o fim da vida, resolve fazer um imodesto balanço de sua existência.

O dado curioso é que Frank Sinatra não gostava de “My Way”, pois a letra mostra um sujeito que, ao fazer o tal balanço, considerou que teve muito mais acertos do que erros ao longo da vida. Quando Frank Sinatra lançou a música, muita gente achou que ela fosse autobiográfica e que continha uma certa arrogância.

Por isso mesmo, em algumas ocasiões, Frank fez questão de dizer que a letra não era dele e que ele não tinha nada a ver com a história contada na música. Em alguns shows, ele chegou a dizer, meio que sério, meio que brincando, que “detestava essa música”.

O público achava que ele estava brincando, mas ele falava sério. Em uma entrevista concedida em 2000, dois anos depois da morte do pai, uma das filhas de Frank – a Tina – contou que “o papai sempre achou que a canção era egoísta e autoindulgente, mas essa música ficou presa a ele, que não conseguiu livrar-se dela”.

A um jornalista – Renzo Mora, que escreveu um livro sobre o cantor – Sinatra disse que “eu adoro ter grandes sucessos, mas cada vez que tenho de cantar essa música eu ranjo os dentes, porque, não importa a imagem que tenham de mim, eu odeio me gabar em cima dos outros; odeio falta de modéstia, e é assim que me sinto com essa música”.

Considerando tudo isso, é provável que o velho Frank tenha se revirado no caixão, em seu funeral, pois a música entoada enquanto ele descia à sua última morada foi justamente “My Way”, que ele canta no vídeo abaixo.

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